Membro: IBA MENDES
____
Até que ponto o comportamento humano é determinado por variáveis biológicas? Até que ponto as nossas vontades e ações são resultado de mecanismos genéticos?____
Bom, de acordo com a ideologia determinista, até mesmo o simples ato de gostar de chocolate, em última análise, seria conseqüência genes.
Em seu livro “A Falácia Genética: a ideologia do DNA na imprensa”, Cláudio Tognolli resume esta visão ideológica que, diga-se de passagem, está diretamente atrelada a certas tendências darwinistas. Diz ele:
“Resumindo: todas as estruturas sociais, seja qual for o grupo zoológico estudado, obedecem a um determinismo genético. Por essa teoria, a origem de todos os comportamentos surge da tendência de cada um de nós querer reproduzir os seus próprios genes.
Seríamos títeres, sem importância, comandados pela vontade dos genes — algo muito parecido com aquela “vontade” do Schopenhauer de O mundo como vontade e representação, que tanto ajudou filosoficamente Sigmund Freud na teorização de sua teoria das pulsões.
Nossa visão: o ser humano de Wilson obedecia à vontade dos genes, algo de dentro para fora. Agora, pelo que vemos na mídia, o movimento se inverte: a biotecnologia é vendida como uma ciência capaz de tudo modificar de fora para dentro.
E nesse ponto que a visão do geneticista Lewontin se torna mais importante: o gene não pode ser substituído como uma peça de computador, como requer o nosso espírito de época. Ele é, antes de tudo, social e psicológico.
Refere Lewontin, o enfant-gatê da febre biologista que “a ciência, como outras atividades produtivas, como o Estado, a família, o esporte, é uma instituição social completamente integrada e influenciada pelas estruturas de todas as outras instituições sociais...
Seus resultados são profundamente influenciados por predisposições que derivam da sociedade em que vivemos. Os cientistas não começam a vida como cientistas, mas como seres sociais imersos na família, no Estado, na estrutura produtiva, e eles vêem a natureza pelas lentes que foram moldadas pela sua experiência social, guiada e dirigida por forças no mundo que têm o controle do tempo e do dinheiro”.
E, exatamente sobre esta questão, neste referido livro há uma entrevista com Richard Lewontin (biólogo, PhD e professor do Centro de Pesquisas Alexander Agassiz da Universidade de Harvard), um dos mais ferrenhos críticos desta maléfica ideologia:
O senhor acha que os cientistas em geral têm satanizado o gene?
Lewontin
Claro que o gene é “satanizado” pelos cientistas como também pela imprensa devido à crença no determinismo biológico. Se, assim, os nossos genes nos determinam por completo, então, obviamente, eles devem tornar “pessoas boas” boas e “pessoas ruins” ruins.
Isto também serve como uma justificativa para a punição capital já que, se os crimes, como dizem, está nos genes, então nada pode ser feito a não ser eliminar os assassinos. Esta é a mesma ideologia que levou os nazistas a colocarem pessoas em câmaras de gás, já que eram consideradas “degeneradas” porque sua biologia as fazia degeneradas e, portanto, imutáveis. Agora, com certeza, as pessoas estão sugerindo consertar os genes, mas tudo isso é um grande nonsense.
Seus resultados são profundamente influenciados por predisposições que derivam da sociedade em que vivemos. Os cientistas não começam a vida como cientistas, mas como seres sociais imersos na família, no Estado, na estrutura produtiva, e eles vêem a natureza pelas lentes que foram moldadas pela sua experiência social, guiada e dirigida por forças no mundo que têm o controle do tempo e do dinheiro”.
E, exatamente sobre esta questão, neste referido livro há uma entrevista com Richard Lewontin (biólogo, PhD e professor do Centro de Pesquisas Alexander Agassiz da Universidade de Harvard), um dos mais ferrenhos críticos desta maléfica ideologia:
O senhor acha que os cientistas em geral têm satanizado o gene?
Lewontin
Claro que o gene é “satanizado” pelos cientistas como também pela imprensa devido à crença no determinismo biológico. Se, assim, os nossos genes nos determinam por completo, então, obviamente, eles devem tornar “pessoas boas” boas e “pessoas ruins” ruins.
Isto também serve como uma justificativa para a punição capital já que, se os crimes, como dizem, está nos genes, então nada pode ser feito a não ser eliminar os assassinos. Esta é a mesma ideologia que levou os nazistas a colocarem pessoas em câmaras de gás, já que eram consideradas “degeneradas” porque sua biologia as fazia degeneradas e, portanto, imutáveis. Agora, com certeza, as pessoas estão sugerindo consertar os genes, mas tudo isso é um grande nonsense.
O senhor acha que a genética e biotecnologia podem ser Consideradas questões geopolítica?
Lewontin
Não, não é claro para mim ainda que a força dos genes seja parte da geopolítica. Eu não sei se algum governo ou grupo político efetivamente estejam argüindo isso porque outras nações dispõem de genes errados e por isso deva ser atacada por isso, ou mantida numa posição de enfraquecimento. Também não sobre quaisquer argumentos que façam do determinismo genético algo similar a um erro ideológico.
O comunismo foi tido como um inimigo por que os comunistas ameaçavam privilegiar o Estado e as bases da economia e restringir a liberdade da propriedade privada, a qual a ideologia capitalista creia seja a base de toda a liberdade.
Os genes não são vistos como inimigos subversivos, mas como a fonte de “doenças” individuais que fazem pessoas doentes mental e fisicamente. Mas essas mesmas pessoas argumentam que a estrutura da sociedade também é determinada pelos genes, então o capitalismo está nos genes então isso prova que o capitalismo é bom e necessário, então os genes são ao mesmo tempo bons e maus!
O senhor teme uma nova febre de eugenia?
Lewootin
Eu não temo uma nova onda eugênica no senso original, que é o de se ter políticas de Estado para manter certas pessoas longe de se procriar ou recompensar a geração de pessoas “melhores”. Isso agora já caiu em descrédito, não porque as pessoas sejam menos biologicamente deterministas, mas porque elas pensam que a forma de se lidar com os criados pelos genes é encorajar indivíduos a se submeterem a testes e tomar decisões particulares de procriação que serão boas para as sua famílias fazendo do uso de inseminação artificial, fertilização in viltro e aborto, mas sempre mais voluntariamente do que numa matéria de política de Estado. Eles também esperam que as manipulações de DNA possam inserir genes “melhores” nas pessoas que as querem (e que possam pagar por elas).
Lewontin
Não, não é claro para mim ainda que a força dos genes seja parte da geopolítica. Eu não sei se algum governo ou grupo político efetivamente estejam argüindo isso porque outras nações dispõem de genes errados e por isso deva ser atacada por isso, ou mantida numa posição de enfraquecimento. Também não sobre quaisquer argumentos que façam do determinismo genético algo similar a um erro ideológico.
O comunismo foi tido como um inimigo por que os comunistas ameaçavam privilegiar o Estado e as bases da economia e restringir a liberdade da propriedade privada, a qual a ideologia capitalista creia seja a base de toda a liberdade.
Os genes não são vistos como inimigos subversivos, mas como a fonte de “doenças” individuais que fazem pessoas doentes mental e fisicamente. Mas essas mesmas pessoas argumentam que a estrutura da sociedade também é determinada pelos genes, então o capitalismo está nos genes então isso prova que o capitalismo é bom e necessário, então os genes são ao mesmo tempo bons e maus!
O senhor teme uma nova febre de eugenia?
Lewootin
Eu não temo uma nova onda eugênica no senso original, que é o de se ter políticas de Estado para manter certas pessoas longe de se procriar ou recompensar a geração de pessoas “melhores”. Isso agora já caiu em descrédito, não porque as pessoas sejam menos biologicamente deterministas, mas porque elas pensam que a forma de se lidar com os criados pelos genes é encorajar indivíduos a se submeterem a testes e tomar decisões particulares de procriação que serão boas para as sua famílias fazendo do uso de inseminação artificial, fertilização in viltro e aborto, mas sempre mais voluntariamente do que numa matéria de política de Estado. Eles também esperam que as manipulações de DNA possam inserir genes “melhores” nas pessoas que as querem (e que possam pagar por elas).
Por que há tantos press releases distribuídos mundo afora, sobretudo para as revistas especializadas, falando das “maravilhas” das novas descobertas genéticas?
Lewontin
Não há boa intenção nesses press releases e nessas promessas. Eles têm apenas a função de subir os preços das ações de mercado de forma a que os proprietários das ações possam fazer dinheiro quando um grande anúncio de descoberta é feito, ou mesmo têm a intenção de empurrar as carreiras de cientistas acadêmicos que estão buscando prêmios, menções honrosas, dinheiro para pesquisas, etc. Com certeza, em muitos casos, as mesmas pessoas são cientistas de pesquisa acadêmica e donos das ações das companhias que fazem essas promessas.
O senhor acha que a linguagem da biotecnologia está se aproximando da linguagem da cibernética, em que gene vira chip de computador?
Lewontin
A ideologia do determinismo biológico usa muitas metáforas retiradas do modelo de máquina de Descartes e agora dos modelos computacionais. Essas metáforas permitem então “jogos de linguagem” porque elas são levadas a sério e assim as conseqüências lógicas de se levar metáforas a sério são levadas à última instância.
Todos os cientistas empregam metáforas, mas as metáforas podem ser os maiores inimigos de se compreender adequadamente o mundo material. As pessoas confundem as metáforas com os objetos reais. Norbert Wiener e Arturo Rosenblith escreveram que “o preço da metáfora é a eterna vigilância”.
Fonte:
A Falácia Genética: a ideologia do DNA na imprensa”. De Cláudio Tognolli. Editora escrituras. São Paulo, 2003, p. 265-267).
Lewontin
Não há boa intenção nesses press releases e nessas promessas. Eles têm apenas a função de subir os preços das ações de mercado de forma a que os proprietários das ações possam fazer dinheiro quando um grande anúncio de descoberta é feito, ou mesmo têm a intenção de empurrar as carreiras de cientistas acadêmicos que estão buscando prêmios, menções honrosas, dinheiro para pesquisas, etc. Com certeza, em muitos casos, as mesmas pessoas são cientistas de pesquisa acadêmica e donos das ações das companhias que fazem essas promessas.
O senhor acha que a linguagem da biotecnologia está se aproximando da linguagem da cibernética, em que gene vira chip de computador?
Lewontin
A ideologia do determinismo biológico usa muitas metáforas retiradas do modelo de máquina de Descartes e agora dos modelos computacionais. Essas metáforas permitem então “jogos de linguagem” porque elas são levadas a sério e assim as conseqüências lógicas de se levar metáforas a sério são levadas à última instância.
Todos os cientistas empregam metáforas, mas as metáforas podem ser os maiores inimigos de se compreender adequadamente o mundo material. As pessoas confundem as metáforas com os objetos reais. Norbert Wiener e Arturo Rosenblith escreveram que “o preço da metáfora é a eterna vigilância”.
Fonte:
A Falácia Genética: a ideologia do DNA na imprensa”. De Cláudio Tognolli. Editora escrituras. São Paulo, 2003, p. 265-267).
Tratando da questão ideológica envolvendo os genes, o evolucionista Nélio Bizzo tece pertinentes comentários sobre o assunto, no seu ensaio “Darwinismo, ciência e ideologia”, do qual transcrevo o item:
MORAL DARWINISTA: NOVA CIÊNCIA OU VELHA IDEOLOGIA?
Darwin é, ainda hoje, um dos maiores alvos de paixões intelectuais, mas não é todo dia que nasce uma nova ciência. Esse acontecimento excitante costuma merecer uma capa de revista e o lançamento de algum livro polêmico.
De fato, a edição de 15 de agosto de 1994 da revista Time trazia o título: “infidelidade: pode estar em nossos genes “, anunciando uma nova “psicologia evolucionista”. Tratava- se do lançamento nos Estados Unidos do livro “O animal moral”, de Robert Wright, recentemente traduzido para o português pela Editora Campus, o que confirma o dito popular que diz que notícia ruim chega rápido.
O livro tem uma arquitetura muito interessante. Ele procura responder a intrigante pergunta de porque somos o que somos do ponto de vista de uma visão particular do evolucionismo darwinista. A estratégia é inovadora. Alguns episódios da vida do grande ídolo de Robert Wright, Charles Darwin, são relatados e analisados, apresentando algo próximo de uma versão “darwinista” do darwinismo.
Quais as vantagens adaptativas que Charles Darwin teve ao desposar-se com Emma? Qual teria sido o impulso evolutivo que o teria levado a apresentar a público suas teorias quando percebeu que um competidor se aproximava das mesmas conclusões, comprometendo sua paternidade intelectual?
O passo seguinte será procurar demonstrar que esses casos não se devem a nenhuma particularidade histórica, mas seriam apenas manifestação de uma tendência biológica universal, a que todos estamos sujeitos.
Dentro dessa ótica, o comportamento social humano seria apenas e tão somente o resultado da expressão de genes incrustrudos em nosso material genético, que a seleção natural teria cuidado de apurar com o decorrer das gerações.
MORAL DARWINISTA: NOVA CIÊNCIA OU VELHA IDEOLOGIA?
Darwin é, ainda hoje, um dos maiores alvos de paixões intelectuais, mas não é todo dia que nasce uma nova ciência. Esse acontecimento excitante costuma merecer uma capa de revista e o lançamento de algum livro polêmico.
De fato, a edição de 15 de agosto de 1994 da revista Time trazia o título: “infidelidade: pode estar em nossos genes “, anunciando uma nova “psicologia evolucionista”. Tratava- se do lançamento nos Estados Unidos do livro “O animal moral”, de Robert Wright, recentemente traduzido para o português pela Editora Campus, o que confirma o dito popular que diz que notícia ruim chega rápido.
O livro tem uma arquitetura muito interessante. Ele procura responder a intrigante pergunta de porque somos o que somos do ponto de vista de uma visão particular do evolucionismo darwinista. A estratégia é inovadora. Alguns episódios da vida do grande ídolo de Robert Wright, Charles Darwin, são relatados e analisados, apresentando algo próximo de uma versão “darwinista” do darwinismo.
Quais as vantagens adaptativas que Charles Darwin teve ao desposar-se com Emma? Qual teria sido o impulso evolutivo que o teria levado a apresentar a público suas teorias quando percebeu que um competidor se aproximava das mesmas conclusões, comprometendo sua paternidade intelectual?
O passo seguinte será procurar demonstrar que esses casos não se devem a nenhuma particularidade histórica, mas seriam apenas manifestação de uma tendência biológica universal, a que todos estamos sujeitos.
Dentro dessa ótica, o comportamento social humano seria apenas e tão somente o resultado da expressão de genes incrustrudos em nosso material genético, que a seleção natural teria cuidado de apurar com o decorrer das gerações.
Seria possível agora entender a disputa entre Aquiles e Agamenon, na Ilíada, por uma bela escrava, e porque os filhos nascidos dessas conquistas eram tolerados pelas esposas legítimas, sendo homens livres e utilizando o nome do pai biológico.
A “psicologia evolucionista” poderia até mesmo transformar em paradigma biológico, verdadeiro objetivo perseguido pela natureza, a mulher grega da época heróica de Homero, a reprodutora que cuida da casa, dos filhos e das escravas, que o marido transforma em concubinas a seu bel-prazer.
Da mesma forma, a prostituição, protegida pelo Estado em Atenas, poderia também ser um imperativo biológico. Os jônios, quem diria, poderiam agora ter seu comportamento sexual e sua organização social explicados pela “nova ciência” e, ainda por cima, verem-se transformados em exemplos modelares da evolução biológica do comportamento moral.
É bem verdade que esta não seria a primeira tentativa. Basta lembrar que há pouco mais de vinte anos manchetes anunciavam uma nova ciência e um livro revolucionário: “Sociobiologia: A nova síntese”. Seu autor, Edward Wilson, de Harvard, pretendia explicar os comportamentos sociais humanos, e a própria organização social, sob a ótica do darwinismo.
Os supostos genes que determinariam a riqueza dos indivíduos, posição social, sucesso empresarial e até mesmo a cultura (!),profetizados na época pela sociobiologia, provaram ser apenas mais um exercício de ficção científica ou de proselitismo ideológico.
Robert Wright retoma a questão, agora com cuidados adicionais. Em primeiro lugar, ele possui credenciais científicas poderosas, como Edward Wilson continua tendo, pré-requisito essencial para os candidatos a êmulos de Darwin.
O que nos diz de novo a “psicologia evolucionista”?
A “psicologia evolucionista” poderia até mesmo transformar em paradigma biológico, verdadeiro objetivo perseguido pela natureza, a mulher grega da época heróica de Homero, a reprodutora que cuida da casa, dos filhos e das escravas, que o marido transforma em concubinas a seu bel-prazer.
Da mesma forma, a prostituição, protegida pelo Estado em Atenas, poderia também ser um imperativo biológico. Os jônios, quem diria, poderiam agora ter seu comportamento sexual e sua organização social explicados pela “nova ciência” e, ainda por cima, verem-se transformados em exemplos modelares da evolução biológica do comportamento moral.
É bem verdade que esta não seria a primeira tentativa. Basta lembrar que há pouco mais de vinte anos manchetes anunciavam uma nova ciência e um livro revolucionário: “Sociobiologia: A nova síntese”. Seu autor, Edward Wilson, de Harvard, pretendia explicar os comportamentos sociais humanos, e a própria organização social, sob a ótica do darwinismo.
Os supostos genes que determinariam a riqueza dos indivíduos, posição social, sucesso empresarial e até mesmo a cultura (!),profetizados na época pela sociobiologia, provaram ser apenas mais um exercício de ficção científica ou de proselitismo ideológico.
Robert Wright retoma a questão, agora com cuidados adicionais. Em primeiro lugar, ele possui credenciais científicas poderosas, como Edward Wilson continua tendo, pré-requisito essencial para os candidatos a êmulos de Darwin.
O que nos diz de novo a “psicologia evolucionista”?
Numa discutível aproximação freudiana, ela estaria centrada na “psicologia sexual, que inclui tudo, desde o amor-próprio instável de um adolescente aos juízos estéticos que homens e mulheres fazem uns dos outros, os juízos morais que fazem uns dos outros, e mesmo os juízos dos que pertencem ao seu próprio sexo.”
Existiria uma diferença básica entre a moralidade do homem e a da mulher, uma vez que “grande parte dessa psicologia sexual humana decorre da escassez de ovos (sic) se comparados aos espermatozóides.” A capacidade de produção de células reprodutivas é muito diferente em homens e mulheres e, segundo Wright, isso não seria um detalhe menor para explicar o comportamento sexual e moral humano.
O homem estaria ciente de que dispõe de um arsenal gamético ilimitado, o que lhe permitiria “atirar a esmo” em combates com o sexo oposto, enquanto a mulher teria consciência da limitação numérica de sua munição reprodutiva, o que a obrigaria a optar pela estratégia do “tiro certeiro” para assegurar sua reprodução.
“Até aqui estamos ainda estacionados na retórica sociobiológica da década de 1970. As inovações tomarão — sinal dos tempos — a forma de estruturas biológicas virtuais: os comportamentos seriam produzidos por “Órgãos mentais”, localizados no cérebro, embora sejam tão invisíveis quanto a memória ROM dos computadores. Esses “órgãos virtuais” seriam, como qualquer outro órgão, determinados pelos genes. Esses genes, e não os comportamentos que determinam, é que teriam sido selecionados ao longo das gerações.
Desta forma, as concepções morais humanas poderiam ser tão “biológicas” quanto o ato de respirar ou de fazer a digestão. Os órgãos específicos que se encarregariam dessas tarefas seriam esses “órgãos virtuais” supostamente localizados no cérebro, que teriam introjetado comportamentos na mente humana.
E quais seriam esses comportamentos, essa “moralidade natural biológica”?
Existiria uma diferença básica entre a moralidade do homem e a da mulher, uma vez que “grande parte dessa psicologia sexual humana decorre da escassez de ovos (sic) se comparados aos espermatozóides.” A capacidade de produção de células reprodutivas é muito diferente em homens e mulheres e, segundo Wright, isso não seria um detalhe menor para explicar o comportamento sexual e moral humano.
O homem estaria ciente de que dispõe de um arsenal gamético ilimitado, o que lhe permitiria “atirar a esmo” em combates com o sexo oposto, enquanto a mulher teria consciência da limitação numérica de sua munição reprodutiva, o que a obrigaria a optar pela estratégia do “tiro certeiro” para assegurar sua reprodução.
“Até aqui estamos ainda estacionados na retórica sociobiológica da década de 1970. As inovações tomarão — sinal dos tempos — a forma de estruturas biológicas virtuais: os comportamentos seriam produzidos por “Órgãos mentais”, localizados no cérebro, embora sejam tão invisíveis quanto a memória ROM dos computadores. Esses “órgãos virtuais” seriam, como qualquer outro órgão, determinados pelos genes. Esses genes, e não os comportamentos que determinam, é que teriam sido selecionados ao longo das gerações.
Desta forma, as concepções morais humanas poderiam ser tão “biológicas” quanto o ato de respirar ou de fazer a digestão. Os órgãos específicos que se encarregariam dessas tarefas seriam esses “órgãos virtuais” supostamente localizados no cérebro, que teriam introjetado comportamentos na mente humana.
E quais seriam esses comportamentos, essa “moralidade natural biológica”?
Os homens estariam programados para classificar as mulheres em uma de duas categorias: santa ou prostituta. Algumas mulheres (as santas) teriam como estratégia reprodutiva escolher um homem com posses e poder suficiente para assegurar uma vida tranqüila para si e para seus “ovos”. Elas seduziriam o escolhido, e só permitiriam relações sexuais após o casamento, quando o compromisso estivesse solidamente estabelecido.
Esta teria sido a estratégia de Emma Weedgwood, a primeira “santa” do evangelho darwinista. Wright enfatiza que “se a dicotomia santa prostituta estiver firmemente enraizada na mente masculina, o sexo prematuro com uma mulher pode sufocar o amor nascente”.
O cientista-conselheiro matrimonial arrisca um palpite para as solteironas na mesma página: “se você quer ouvir votos de eterna devoção até o dia de seu casamento — e quer ter certeza de que haverá esse dia — não durma com o seu homem até a lua-de-mel”. Afinal, prossegue Wright ainda na página 114, passando do cientificismo rasteiro para a pura baixaria, “um homem não vai comprar uma vaca se pode (sic) tirar leite de graça.”
Charles Darwin teria pago caro pela sua santinha, um preço que hoje em dia nenhum homem paga mais. Ele e Emma mantiveram um casamento estritamente monogâmico, verdadeira linha de montagem uterina (foram dez filhos). Sem dúvida, foi um tiro certeiro.
A abundância desse tipo de leite nas grandes cidades poderia explicar o declínio do número de casamentos e de filhos nas sociedades modernas. Mas a reprodução, a perpetuação da espécie, dependeria dessa instituição secular de forma que, para Wright, só haveria uma solução: a dura repressão aos transgressores. Mas ele não se refere ao casal.
Esta teria sido a estratégia de Emma Weedgwood, a primeira “santa” do evangelho darwinista. Wright enfatiza que “se a dicotomia santa prostituta estiver firmemente enraizada na mente masculina, o sexo prematuro com uma mulher pode sufocar o amor nascente”.
O cientista-conselheiro matrimonial arrisca um palpite para as solteironas na mesma página: “se você quer ouvir votos de eterna devoção até o dia de seu casamento — e quer ter certeza de que haverá esse dia — não durma com o seu homem até a lua-de-mel”. Afinal, prossegue Wright ainda na página 114, passando do cientificismo rasteiro para a pura baixaria, “um homem não vai comprar uma vaca se pode (sic) tirar leite de graça.”
Charles Darwin teria pago caro pela sua santinha, um preço que hoje em dia nenhum homem paga mais. Ele e Emma mantiveram um casamento estritamente monogâmico, verdadeira linha de montagem uterina (foram dez filhos). Sem dúvida, foi um tiro certeiro.
A abundância desse tipo de leite nas grandes cidades poderia explicar o declínio do número de casamentos e de filhos nas sociedades modernas. Mas a reprodução, a perpetuação da espécie, dependeria dessa instituição secular de forma que, para Wright, só haveria uma solução: a dura repressão aos transgressores. Mas ele não se refere ao casal.
“Uma vez que tenhamos examinado as desvantagens do casamento monogâmico de vida inteira (ele se refere à monotonia, etc), especificamente numa sociedade de economia estratificada — em outras palavras, uma vez que tenhamos examinado a natureza humana — é difícil imaginar outra coisa senão a dura repressão como meio de conservar a união.”
Mas, prossegue ele, não são necessários exageros. Afinal, “a infidelidade masculina talvez não constitua ameaça ao casamento enquanto não leva (sic) à deserção (refere-se ao divórcio); as mulheres aceitam viver com o companheiro que as traiu com maior facilidade do que os homens. E uma forma de assegurar que a infidelidade masculina não conduza à deserção é restringi-la às ... prostitutas”.
Esse “padrão moral de dois pesos e duas medidas pode não ser justo, mas tem uma espécie de fundamento lógico”, uma vez que um marido traído poderia tratar mal seus filhos, duvidando que fossem realmente seus; mas a mulher traída teria sempre certeza que seus filhos provieram do estoque ilimitado de espermatozóides do animal moral que dorme com ela e, ademais, não teria dúvida que o ovócito fecundado em seu ventre é realmente seu.
Será isso uma nova ciência?
Não, definitivamente não é todo dia que nasce uma nova ciência.
O que temos aqui chama-se ideologia. O ideólogo interpreta o mundo à sua volta projetando nele os valores de sua cultura e, tão satisfeito está com eles, acredita que seja pura coincidência encontrá-los fora da esfera de relações por ele construída. Com entusiasmo, e por vezes inconscientemente, julga ter alcançado resultado tão legítimo, verdadeiro e abrangente que refaz o caminho de volta e percebe que pode explicar as relações sociais com a lógica que projetou na natureza. Os valores de sua cultura voltam revigorados, uma vez que seriam agora expressão do mundo natural, de Deus ou da seleção natural".
Fonte:
"Perspectivas em Epistemologia e história das ciências". In: Darwinismo, ciência e ideologia. Nélio Bizzo (da USP). UEFS/BA.
Mas, prossegue ele, não são necessários exageros. Afinal, “a infidelidade masculina talvez não constitua ameaça ao casamento enquanto não leva (sic) à deserção (refere-se ao divórcio); as mulheres aceitam viver com o companheiro que as traiu com maior facilidade do que os homens. E uma forma de assegurar que a infidelidade masculina não conduza à deserção é restringi-la às ... prostitutas”.
Esse “padrão moral de dois pesos e duas medidas pode não ser justo, mas tem uma espécie de fundamento lógico”, uma vez que um marido traído poderia tratar mal seus filhos, duvidando que fossem realmente seus; mas a mulher traída teria sempre certeza que seus filhos provieram do estoque ilimitado de espermatozóides do animal moral que dorme com ela e, ademais, não teria dúvida que o ovócito fecundado em seu ventre é realmente seu.
Será isso uma nova ciência?
Não, definitivamente não é todo dia que nasce uma nova ciência.
O que temos aqui chama-se ideologia. O ideólogo interpreta o mundo à sua volta projetando nele os valores de sua cultura e, tão satisfeito está com eles, acredita que seja pura coincidência encontrá-los fora da esfera de relações por ele construída. Com entusiasmo, e por vezes inconscientemente, julga ter alcançado resultado tão legítimo, verdadeiro e abrangente que refaz o caminho de volta e percebe que pode explicar as relações sociais com a lógica que projetou na natureza. Os valores de sua cultura voltam revigorados, uma vez que seriam agora expressão do mundo natural, de Deus ou da seleção natural".
Fonte:
"Perspectivas em Epistemologia e história das ciências". In: Darwinismo, ciência e ideologia. Nélio Bizzo (da USP). UEFS/BA.
O debate segue neste link do Orkut:
http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=26796515&tid=2568596133350948586
Nenhum comentário:
Postar um comentário