sexta-feira, 10 de julho de 2009

Evolução, velhice e morte

Membro: IBA MENDES
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”A duração da nossa vida é de setenta anos, e se alguns, pela sua robustez, chegam a oitenta anos, o melhor deles é canseira e enfado, pois passa rapidamente, e nós voamos”
(Salmo 90:10).


Acabei de ler “Memórias de minhas putas tristes”, do prêmio Nobel de literatura Gabriel Garcia Marquez. Foi quando veio à minha mente uma intrigante questão, aliás, muito pouco abordada pela literatura darwinista. Vamos ao “Memórias”:

”Fazia meses que tinha previsto que minha crônica de aniversário não seria o mesmo e martelado lamento pêlos anos idos, mas o contrário: uma glorificação da velhice. Comecei por me perguntar quando tomei consciência de ser velho, e acho que foi pouco antes daquele dia. Aos quarenta e dois anos havia acudido ao médico por causa de uma dor nas costas que me estorvava para respirar. Ele não deu importância: É uma dor natural na sua idade, falou.

— Então — disse eu —, o que não é natural é a minha idade.

O médico me deu um sorriso de lástima. Vejo que o senhor é um filósofo, disse ele. Foi a primeira vez que pensei na minha idade em termos de velhice, mas não tardei a esquecer o assunto. E me acostumei a despertar cada dia com uma dor diferente que ia mudando de lugar e forma, à medida que passavam os anos. Às vezes parecia ser uma garrotada da morte e no dia seguinte se esfumava. Nessa época ouvi dizer que o primeiro sintoma da velhice é quando a gente começa a se parecer com o próprio pai. Devo estar condenado à juventude eterna, pensei então, porque meu perfil equino não se parecerá jamais ao caribenho cru que era meu pai, nem ao romano imperial de minha mãe. A verdade é que as primeiras mudanças são tão lentas que mal se notam, e a gente continua se vendo por dentro como sempre foi, mas de fora os outros reparam.

Na quinta década havia começado a imaginar o que era a velhice quando notei os primeiros ocos da memória. Revirava a casa buscando meus óculos até descobrir que os estava usando, ou entrava com eles no chuveiro, ou punha os de leitura sem tirar os de ver de longe. Um dia tomei duas vezes o café da manhã porque me esqueci da primeira, e aprendi a reconhecer o alarme de meus amigos quando não se atreviam a me lembrar que estava contando a mesma história que havia contado na semana anterior. Naquele tempo tinha na memória uma lista de rostos conhecidos e outra com os nomes de cada um, mas no momento de cumprimentar não conseguia que as caras coincidissem com os nomes”.

[...]

”Desde então comecei a medir a vida não pelos anos, mas pelas décadas. A dos cinqüenta havia sido decisiva porque tomei consciência de que quase todo mundo era mais moço que eu. A dos sessenta foi a mais intensa pela suspeita de que já não me sobrava tempo para em enganar. A dos setenta foi temível por uma certa possibilidade de que fosse a última. Ainda assim, quando despertei vivo na primeira manhã de meus noventa anos na cama feliz de Delganina, me atravessou uma idéia complacente de que a vida não fosse algo que transcorre como o rio revolto de Heráclito, mas uma ocasião única de dar a volta na grelha e continuar assando-se do outro lado por noventa anos a mais” ” (Do “Memórias de minhas putas tristes”).

A questão que pretendo tratar neste tópico diz respeito à velhice e sua fatal consequência, isto é, a morte, ou como diria bandeira: a “indesejada das gentes", porém do ponto de vista evolutivo, ou se preferirem, da seleção natural. Por exemplo:

Em termos adaptativos, que vantagem nossos supostos ancestrais realmente podiam extrair, na aurora da humanidade, ao saber que tinham que inevitavelmente morrer?

Evolutivamente por que cargas d’água a seleção natural não escolheu características tais que pudessem tornar muito mais longa a vida humana?

Por que não as selecionou ela e de tal maneira que se evitasse falhas de replicação, falhas de metabolismo e outros processos que provocam nossa degeneração?

Estaria porventura o ser humano adaptado psicologicamente para a morte? Em caso afirmativo, por que então esta diária e ferrenha luta contra ela? Sim, o que leva o homem a evitar a morte? Em outras palavras: o que leva o homem a adiá-la? Acaso a obsessão de livrar-se dela de forma permanente?

É isso!


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